A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve o acórdão que descaracterizou como ato ímprobo a acumulação de dois cargos de assessor jurídico em municípios distintos do Rio Grande do Sul. O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) denunciou a improbidade administrativa do assessor, que ofenderia o princípio da legalidade. O STJ, entretanto, considerou o ato mera irregularidade, afastando, assim, a violação à Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa).
A ação civil pública do Ministério Público gaúcho foi julgada improcedente pelo juízo de primeiro grau, pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) e por decisão individual do ministro do STJ Humberto Martins. O MP-RS recorreu para que a questão fosse aprecida pela Turma, que, por sua vez, confirmou a decisão. O MP-RS alegou que a conduta ímproba teria sido plenamente demonstrada, e que, além de impróprio, a não aplicação das sanções previstas pela lei seria incentivar práticas ilícitas.
O ministro Humberto Martins, relator, lembrou as razões pelas quais o STJ não havia considerado o ato de improbidade: ausência de dolo ou culpa do agente ao receber as quantias cumulativamente; e inexistência de prejuízo ao erário, visto que ele prestou os dois serviços satisfatoriamente, recebendo valores que não lhe geraram enriquecimento.
Sabe-se que a Lei 8.429/1992 é instrumento salutar na defesa da moralidade administrativa, porém sua aplicação deve ser feita com cautela, evitando-se a imposição de sanções em face de erros toleráveis e meras irregularidades, afirmou o relator. Na ótica do ministro, examinadas as circunstâncias efetiva prestação do serviço, valor irrisório da contraprestação e boa-fé pode-se considerar apenas a ocorrência de irregularidade, e não de desvio ético ou imoralidade.
Pronúncia
A decisão de pronúncia que não faz juízo conclusivo sobre a participação do réu nos fatos da denúncia, de modo a influenciar o julgamento futuro pelo Tribunal do Júri, não é nula. Nessas hipóteses não há linguagem excessiva pela apreciação exaustiva da acusação, o que levaria à invasão, pelo juiz, da competência dos jurados.
O entendimento foi aplicado pelo vice-presidente STJ, ministro Felix Fischer, para negar liminar a acusado de homicídio. Para a defesa, a pronúncia avaliou de modo excessivamente profundo e indevido o mérito da acusação, incorreu em excesso de linguagem e condenou antecipadamente o réu, a ponto de influir na futura decisão do Conselho de Sentença.
O pedido liminar era de suspensão do processo e foi negado pelo ministro Fischer, que está no exercício da Presidência do STJ até hoje.
O ministro explicou que a decisão de pronúncia deve se limitar a indicar a existência de provas de materialidade e indícios de autoria do crime. A eventual conclusão pela responsabilidade penal do agente cabe ao Tribunal do Júri, ao fim do processo.
Indícios
No caso em exame, a apontada eloquência acusatória capaz de influir no ânimo dos jurados, ao menos neste juízo de prelibação, não se faz presente, julgou o ministro. Ele afirmou que a sentença de pronúncia apenas indicou os indícios de autoria, de modo a discutir se o caso se enquadraria em conduta dolosa. O ministro citou trecho da sentença para apontar que não houve afirmação categórica da ocorrência de dolo eventual. Afirma a sentença que o fato traduz-se, em princípio, em comportamento doloso.
O reconhecimento do vício do excesso de linguagem reclama a verificação do uso de frases, afirmações ou assertivas que traduzam verdadeiro juízo conclusivo sobre a participação do acusado, de maneira a influenciar os jurados futuramente no julgamento a ser realizado, assegurou o vice-presidente. Vedase, portanto, a eloquência acusatória, por extrapolar o mero juízo de admissibilidade da acusação, invadindo a competência do Conselho de Sentença, hipótese, ao que parece, inocorrente na espécie, em que não houve esse juízo antecipado, concluiu. (Jornal do Commércio)